O século XXI chegou
expressando no seu tempo a dinâmica doentia proposta pelo homem moderno nos
espaços que ele ocupa (principalmente os grandes centros urbanos). Tal dinâmica
se manifesta principalmente através do grande avanço tecnológico e econômico –
não necessariamente nessa ordem – a que nossas sociedades se submeteram, e
quando falo em “sociedade” no plural, eu aponto para a variedade de grupos
existentes nas cidades e suas representações, pondo em evidência as diversas
formas de comportamento existentes e o perigo da falta de diálogo entre elas.
Isso denuncia outro mal dos espaços citadinos, tão presente na mentalidade do
homem moderno, que é a estética “tribal” dos mais diversos grupos sociais que
existem e, dentro de sua existência “coletiva”, acaba por não estabelecer
relações com outros grupos, sendo regidos por práticas intolerantes que
acarreta num isolamento, como ilhas de um arquipélago que não estabelecem
relações entre si. A impressão que se tem é que o homem moderno perdeu o senso
de coletivo e, junto a isso, perdeu tantos outros sensos ligados ao viver
social, como o de família, de solidariedade, de amor e o de pertencimento à
sociedade na qual ele vive.
Pode parecer exagero afirmar
que o homem moderno perdeu a característica da sociabilidade, mas o que se pode
constatar é que, nas grandes cidades, o homem moderno vive para promover o
progresso do Estado e de suas instituições, deixando num plano inferior a
auto-realização e os projetos de vida dele, ligados voluntariamente à todos
aqueles que para ele são importantes. Os homens vivem hoje em suas casas,
verdadeiros universos restritos de sua existência, e fora desse espaço o homem
se torna um mero figurante do progresso e da estrutura física e social da
cidade moderna, assumindo a condição de anônimo dentro da sua realidade, sendo
irrelevante na dinâmica global social, de trocas de experiências e pensamentos.
O tempo se encarregou de
reduzir o homem à condição de máquina, ou de uma coisa qualquer, fria para a
construção de uma identidade coletiva capaz de estruturar com a devida
consistência um determinado grupo de homens habilitados a viver uma experiência
social plena.
Nesse sentido, analisando a
decadência evidente do homem moderno/urbano enquanto ser social, é possível
pensar num possível resgate desse homem através de uma nova tomada de
consciência, capaz de abolir, num primeiro momento, a dinâmica feroz dos
grandes centros. Assim, estabelecendo o caminho da ruralização desse homem,
pode-se possibilitar um estímulo para a sua natureza social, pois se anularmos
o trabalho intenso e exaustivo no qual o homem citadino se submete diariamente,
dando vez ao trabalho coletivo, verdadeiro, com a necessária relação de troca
de experiências, onde a família esteja presente e não haja exploração maldosa
do Estado , a realidade do homem (e dos homens) será alterada, e isso
acarretará na constituição de uma sociedade plena, onde os homens serão de fato
um grupo expressivo, onde a sua natureza social será posta em evidência. Porém,
isso não anula o caráter individual de cada homem, pois cada sujeito representa
uma unidade de práticas e pensamentos, e é justamente esses elementos que, ao
serem somados, constroem a identidade especifica da sociedade.
As cidades adoecem o homem,
o imbeciliza e os torna mesquinhos e perversos. Nas cidades o homem se isolam
cada vez mais nos seus planos individuais de vida e são mecanicamente induzidos
à indiferença no que se refere aos problemas dos outros. O homem que deseja a
liberdade deve se desligar desses modelos de vida e se aventurar numa nova
prática de vida. O homem deve fugir dos grandes centros urbanos em direção ao
campo, aos pampas, ao pantanal, às cordilheiras, ao deserto e à todos os
lugares seguramente distantes da cidade e de sua atmosfera cancerígena, porque
assim o homem encontrará razões mais claras para a sua existência.
Nesse sentido, a teoria da
ruralização do homem moderno (ou o chicobentismo) traz na sua execução a
proposta de uma sociedade igualitária, mas não no aspecto
romântico-utópico-incoerente do sistema socialista e dos modelos de sociedade
teorizado por Marx, mas sim no aspecto puramente de vivência mais intima com os
tantos outros sujeitos sociais em potencial que povoam o mundo.
A ruralização do homem
moderno traz no seu sentido a melhoria da vida do homem no que se refere às
suas vivências com outros sujeitos. Através desse novo modelo de vida, o homem
pode inserir, verdadeiramente, a família e todos aqueles que se ligam por
qualquer espécie de laço (amigos, parceiros, amantes...), observando a
necessidade da presença destes para a construção de uma sociedade saudável (num
ambiente saudável). Isso possibilitará o fim da relação entre pessoas em graus
hierárquicos, além de acabar, através da relação amistosa, com o sentimento
indiferente de coleguismo para com o próximo nos ambientes de trabalho típico
dos grandes centros urbanos.
No campo, a vida pode
oferecer melhores condições de desenvolvimento através do real trabalho
coletivo, onde a comunicação se faz mais possível e mais necessária, tendo em
vista a harmonia da localidade tranquila, tão necessária para os nervos
abalados do homem citadino, que ficou negativamente marcado pelo horror
agressivo dos grandes edifícios, do trânsito caótico (estimulador da violência
gratuita) e das relações doentias entre pessoas desequilibradas emocionalmente
pela grande carga de exaustão, consequência direta do cotidiano intenso da
cidade grande.
Por fim, o abandono da
cidade grande trará ao homem moderno uma grande chance de reiniciar sua vida,
observando a real melhoria de sua existência, melhorando a sua saúde,
proporcionando maiores qualidades nos seus trabalhos e nas suas relações,
ligando-o de maneira mais intensa à sua família e às suas raízes. O homem
encontrará a real felicidade e o sentido claro de sua vida longe das grandes
avenidas, num lugar onde ele estará seguramente amparado e protegido, na
varanda de sua casa, onde ele possa descansar o corpo e o espírito enquanto
observa o fim da tarde sentado em sua cadeira, enquanto ele espera chegar os
primeiros amigos para iniciar as frequentes conversas noturnas, tão comum no
interior, onde ele possa, nas horas de sossego, narrar histórias fantásticas
sobre o folclore local, contribuindo para a preservação e transformação de seus
aspectos culturais, tão forte nas pequenas vilas e povoados espalhados pelo
Brasil. O homem poderá transformar a sua realidade a partir do momento que ele
decidir anular em si a formação imbecilizante da cidade grande, marcada pela
competitividade, pelo egoísmo e pela desonestidade e dar lugar a tudo isso para
a verdadeira comunhão entre os demais homens, onde não haja mais o desgaste
excessivo dos trabalhos intensos da cidade e a odiosa exploração hierárquica
das grandes empresas. Assim, o homem realmente se emancipará da louca dinâmica
urbana e, com o inicio da jornada do homem moderno ruralizado, o mundo se
tornará um lugar melhor para se viver.